Impacto das dietas de textura modificada no estado nutricional dos idosos

A população idosa, definida como os indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos, tem vindo a aumentar ao longo dos últimos anos, a nível global, sendo que esse crescimento irá ser ainda mais acentuado nas próximas décadas. (1,2)

Durante o processo de envelhecimento ocorrem alterações nos vários sistemas e órgãos, das quais se destacam as alterações sensoriais, orofaríngeas e gastrointestinais. Estas alterações podem desencadear variações no padrão alimentar, culimando na diminuição de ingestão de nutrientes fundamentais para o bom funcionamento do organismo e, consequentemente, comprometendo o estado nutricional da pessoa idosa (3). Observam-se, ainda, alterações relacionadas com a diminuição da produção de saliva, assim como uma higiene e saúde oral muitas vezes deficitária (ausência de peças dentárias e/ou próteses desajustadas), que influenciam negativamente a mastigação e/ou a  deglutição(4)(5). A presença de doenças crónicas, naturalmente associadas à idade avançada, como doenças cardiovasculares, respiratórias, osteoarticulares, depressão e demência, podem influenciar a capacidade funcional e/ou de deglutição, potenciando o desenvolvimento de estados de malnutrição (6).

A disfagia define-se como a dificuldade ou desconforto durante a progressão do bolo alimentar, desde a boca até ao estômago. Referem-se como sintomas de disfagia a aspiração de resíduo alimentar, pigarrear, tosse, voz molhada, períodos de ventilação atípicos, e múltiplas deglutições (4).

A prevalência desta condição é cada vez mais frequente na população idosa, seja pelo efeito fisiológico do envelhecimento, que contribui para o seu desenvolvimento, como pela presença de comorbilidades associadas - doenças neurológicas como Acidente Vascular Cerebral (AVC), Doença de Parkinson, entre outras - que contribuem para a permanência prolongada em hospitais ou residências geriátricas (4). Estima-se que 10 a 20% dos seniores têm dificuldades em engolir bebidas ou alimentos, isto é, para formar e mover o bolo alimentar desde a boca até ao esófago. Tendencialmente, alteram as suas escolhas alimentares para outras mais fáceis de mastigar, mas nutricionalmente mais pobres e monótonas, contribuindo para a perda de peso involuntária. Assim, a disfagia compromete o bem-estar e os aspetos sociais associados à alimentação do indivíduo.

A disfagia afeta a maioria dos indivíduos institucionalizados, com prevalências reportadas que ascendem aos 60% (4).

A dificuldade em deglutir, associada a uma dieta desajustada no que se refere à viscosidade dos alimentos sólidos, ou dos líquidos espessados, dificulta a ingestão alimentar e hídrica. Desta forma, promove a ocorrência de outros problemas que, para além da desnutrição e desidratação, contribuem para a deterioração da situação clínica do doente, tais como a pneumonia por aspiração, infeções no trato respiratório inferior, aumento do tempo de internamento, entre outros (4)(7)(8). A modificação da textura das dietas diminui a necessidade de mastigação e preparação oral do alimento, constituindo-se assim como o principal elemento da terapêutica necessária para o doente disfágico (9).

Vantagens das Dietas de Textura Modificada

As dietas de textura modificada, habitualmente em consistência mole ou cremosa, pelo seu processo de confeção e apresentação, são monótonas do ponto de vista sensorial. Assim, dificultam a adesão por parte do doente e são, frequentemente, nutricionalmente incompletas, tanto a nível energético, como a nível de macro e micronutrientes, existindo vários estudos que associam a prescrição deste tipo de dieta à presença de desnutrição, em pessoas que a ingerem durante um período de tempo prolongado (10)(11). A dieta de textura modificada está indicada em situações em que se verifiquem episódios recorrentes de engasgamento, ausência de dentição e défice cognitivo. Este tipo de dieta diminui o risco de engasgamento, através da minoração do processamento motor e oral. Para além disso, potencia uma maior e melhor ingestão alimentar, combatendo a fadiga associada ao processo de alimentação.

Não obstante, a disfagia, por si só, apresenta um elevado impacto na qualidade de vida associada à alimentação, estando descrito na literatura que os idosos institucionalizados evitam realizar refeições acompanhados devido a disfagia, e/ou que se sentem ansiosos durante a alimentação (4).

No entanto, as dietas de textura modificada disponibilizadas pela indústria permitem maior e melhor aporte energético e proteico, melhorando o prognóstico dos doentes, e ainda uma melhor qualidade de vida.

A desidratação é também um problema comum nos idosos, associada à alteração do processo de deglutição (12). Particularmente, os idosos que recorrem à hidratação com líquidos espessados frequentemente não atingem a ingestão hídrica diária recomendada, existindo estudos que reportam a adequação desta ingestão em apenas 6,7%, pelo que o estado de hidratação dos doentes com disfagia deve ser monitorizado e corrigido, recorrendo aos líquidos espessados e águas gelificadas (13).

A disfagia, se não for identificada, diagnosticada e tratada pode causar: perda de peso e de massa muscular de forma involuntária, desnutrição e desidratação por uma diminuição da ingestão. Assim, esta patologia carece de identificação sistemática e precoce, para que a intervenção terapêutica possa ser implementada com sucesso.

O estado nutricional adequado é fundamental para um bom estado de saúde. No entanto, sabemos que a relação entre a desnutrição e a disfagia já foi estabelecida, o que enfatiza a necessidade da avaliação do estado nutricional de idosos com disfagia, tendo em conta que esta condição pode ser a etiologia da desnutrição.

Bibliografia

  1. Publications Office of the European Union. The 2018 Ageing Report: Underlying Assumptions & Projection Methodologies. Luxembourg; 2018.
  2. United Nations, Department of Economic and Social Affairs PD. World Population Prospects: The 2017 Revision, Key Findings and Advance Tables. World Population Prospects. 2017.
  3. Brownie S. Why are elderly individuals at risk of nutritional deficiency? Int J Nurs Pract. 2006;12(2):110–8.
  4. Baijens LWJ, Clavé P, Cras P, Ekberg O, Forster A, Kolb GF, et al. European society for swallowing disorders - European union geriatric medicine society white paper: Oropharyngeal dysphagia as a geriatric syndrome. Clin Interv Aging. 2016;11:1403–28.
  5. Sura L, Madhavan A, Carnaby G, Crary MA. Dysphagia in the elderly: Management and nutritional considerations. Clinical Interventions in Aging. 2012.
  6. Leslie W, Hankey C. Aging, Nutritional Status and Health. Healthcare. 2015;3(3):648–58.
  7. Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. I Consenso Brasileiro de Nutrição e Disfagia em Idosos hospitalizados. 1a. Brasil: Editora Manole; 2011. 1–106 p.
  8. Melgaard D, Rodrigo-Domingo M, Mørch MM. The prevalence of oropharyngeal dysphagia in acute geriatric patients. Geriatr. 2018.
  9. Atherton M, Bellis-Smith N, Cichero JAY, Suter M. Texture-modified foods and thickened fluids as used for individuals with dysphagia: Australian standardised labels and definitions. Nutr Diet. 2007.
  10. O’Keeffe ST. Use of modified diets to prevent aspiration in oropharyngeal dysphagia: Is current practice justified? BMC Geriatrics. 2018.
  11. Wright L, Cotter D, Hickson M, Frost G. Comparison of energy and protein intakes of older people consuming a texture modified diet with a normal hospital diet. J Hum Nutr Diet. 2005;18(3):213–9.
  12. Mendes J, Padrão P, Moreira P, Santos A, Borges N, Afonso C, et al. Handgrip Strength and Its Association With Hydration Status and Urinary Sodium-to-Potassium Ratio in Older Adults. J Am Coll Nutr. 2020;39(3):192–9.
  13. Painter V, Le Couteur DG, Waite LM. Texture-modified food and fluids in dementia and residential aged care facilities. Clin Interv Aging. 2017;12:1193–203. 
Maria Armanda Marques

Nutricionista

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